sexta-feira, 19 de junho de 2015

Laura Gutman me salvando - de novo

Uma das coisas que enfatizei no post "coisas para se pensar antes de ter um filho" foi a questão da divisão das tarefas domésticas.

Novamente no livro da Laura Gutman que mencionei no post anterior, ela aborda este tópico de maneira bem interessante, por isso transcrevo-o aqui e espero que possa ajudar mais pessoas :)

Colaborar em casa.
Por Laura Gutman, do livro: Mulheres visíveis, mães invisíveis. Pág. 135 - 137
* os grifos em negrito são exatamente como estão no livro

As tarefas do lar, ou seja, os pequenos atos cotidianos que nos proporcionam conforto, higiene, bem estar físico e ordem perderam todo o prestígio e o valor social. Desde que as mulheres passaram a circular no mundo externo, tudo o que se refere à "casa" perdeu a visibilidade. Portanto, queremos fugir desse lugar inxistente. Só fica preso quem não consegue escapar a tempo.
As mulheres carregaram séculos de história em que a responsabilidade pelo funcionamento do lar, onde viviam aprisionadas, e o ambiente se confundia com sua identidade. Viviam em um cárcere emocional, desprovidas de mobilidade e da autonomia proporcionada pelo "estar fora". É, portanto,  compreensível que, depois de terem conquistado certa liberdade no tocante ao dinheiro e à sexualidade, sintam o lar, aquele terreno das obrigações domésticas invisíveis, como um lugar prejudicial à sua autoestima. 
No entanto, todo mundo precisa de um mínimo de ordem e conforto para satisfazer suas necessidades básicas de higiene e alimentação. Alguém tem que trabalhar.
O interessante é que todas as tarefas domésticas são simples e até prazerosas em si mesmas. O verdadeiro problema é o valor que lhes é dado. Para as mulheres, é óbvio que elas estão marcadas pela submissão e o obscurantismo. Portanto raramente irão considerá-las libertadoras, embora, quando despojadas do peso histórico, sejam positivas e estejam a serviço de pessoas, inclusive delas próprias. 
Também precisamos admitir que os homens não conseguem aceitar que as tarefas de um lar, um espaço coletivo, caibam a todos os adultos por igual. 
Portanto, cansadas e com a sensação de que fomos injustiçadas, dizemos aos nossos filhos que as tarefas do lar não passam de uma obrigação desagradável com a qual não temos nenhuma afinidade e não nos traz benefício algum. Na maioria das vezes, "arrumar o quarto" é uma ordem que é dada às crianças como se fosse castigo. Raramente vamos "arrumar juntos"  como se aquilo fosse uma brincadeira compartilhada. Quando pedimos às crianças que colaborem, constumamos ficar irritadas, exaustas, sem paciência e querendo que elas se encarreguem dessa tarefa "horrível" que ninguém mais quer fazer. 
E assim vamos aprofundando a brecha entre o "dentro" e o "fora".
"Fora" é onde as mães e os pais trabalham. "Fora" é onde as crianças estudam e fazem as mais variadas atividades. Por sua vez "dentro" é onde as crianças ficam passivas (veem televisão) ao lado de pais também passivos (veem televisão). As atividades acontecem fora. A passividade acontece dentro. Deixamos de considerar as atividades do lar como parte das relações interfamiliares.
Não é fácil arrumar estantes, fazer compras, organizar a despensa, varrer, lavar, ou passar roupas com crianças correndo ao redor. E menos ainda quando essas tarefas nos remetem a um passado aterrorizante e realizamos tudo depressa e com tédio, tentanto, em vão, fazer com que as crianças não nos incomodem muito. Mas, se conseguíssemos parar e descobrir que podemos fazer os trabalhos domésticos com as crianças, conversando ou brincando, veríamos que algumas delas - nem todas - não são tão chatas assim. Vai depender da idade das crianças, naturalmente. E do tempo que tenhamos disponível, que, como já sabemos, é muito escasso.
É verdade que não será fácil fazer com que colaborem sempre. É verdade que teremos que fazer acordos com o pai das crianças, se é que há um em casa. Os acordos tácitos que atravessaram gerações - aqueles a respeito do poder, do papel da mulher como empregada e do homem como amo e senhor - ficaram obsoletos. No entanto, ainda não conseguimos estabelecer parâmetros claros para a coabitação. Este é um desafio que tem como cenário a invisibilidade do lar e é fundamental para a evolução das relações humanas. 
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O que gosto de pensar sobre tudo isso é que não existem regras. As reflexões são propostas e cada família deve encontrar a melhor maneira que funcione para todos. É processo, é caminhada, é construção :)


quarta-feira, 3 de junho de 2015

Laura Gutman me salvando

Li esse texto e foi um alívio. É essa a sensação que tenho quando alguém materializa o que eu sinto ou senti e não conseguia explicar.
Por isso quero transcrevê-lo aqui. Se puder ajudar mais pessoas vai ser ainda melhor <3
Os grifos em negrito são originários do próprio livro. O sublinhado é meu mesmo.

Uma visão feminina da paternidade.
Por Laura Gutman, do livro: Mulheres visíveis, mães invisíveis. Pág. 133 e 134.

Esses não são tempos fáceis para os homens ou para as mulheres. Nós conquistamos o mundo masculino e os homens perderam suas identidades históricas. Serão necessárias algumas gerações para que possamos voltar a nos situar em um mundo sem regras fixas.
A paternidade também deixou os homens deslocados. Há um aparente consenso a respeito dos pais modernos que trocam fraldas, que brincam com as crianças ou que ajudam nas tarefas domésticas. E não muito mais.
No entanto, ser mãe ou pai é, sobretudo, abandonar os interesses pessoais e se colocar a serviço do outro - de maneira interamente altruísta. A mãe sustenta o filho e o pai sustenta a mãe. Pelo menos é isso o que existe dentros dos padrões da família nuclear, que está longe de ser o ideal para a criação dos filhos.
No entanto, as mulheres costumam confundir o "apoio emocional" que recebem com a "ajuda concreta para a educação do filho". São duas situações muito distintas. Uma mãe sustentada poderá sustentar a criança. Uma mãe desamparada se "afogará em um copo d`água". Sentindo-se solitária, pedirá qualquer coisa, a qualquer momento e nunca ficará satisfeita, mesmo que o homem tente banhar a criança, leve-a para passear ou acorde à noite para acalmá-la. Então o homem ficará desconcertado e não saberá mais o que fazer para tranquilizá-la.
É ótimo que o pai troque uma fralda. Mas a condição fundamental para um funcionamento familiar equilibrado é a de que desempenhe o papel de esteio emocional da mãe. Não é necessário que mergulhe no redemoinho emocional, porque esta não é sua função. Ao contrário: é necessário que alguém mantenha sua estrutura emocional intacta e se precoupe com o mundo material para que a mãe não se veja obrigada a abandonar o mundo emocional no qual está submersa. O pai não tem que maternar - tem que apoiar a mãe para cumprir seu papel de maternagem. 
Tenho duas sugestões a fazer aos homens emocionalmente amadurecidos: antes de sair para trabalhar de manhã, faça duas perguntas à sua mulher: "Como você está se sentindo?" e "O que você precisa hoje de mim?" É muito simples.
A maioria dos homens retoma suas atividades profissionais, toma banho, faz a barba todas as manhãs, engole o café e sai exatamente na mesma hora de sempre, "como se nada tivesse acontecido". E, da mesma maneira, acha que nada do que aconteça quando estiver ausente lhe diz respeito, e que sua mulher, eficiente como sempre, conseguirá se virar sozinha com o bebê. É uma ideia falsa. Deveria alterar sua rotina? Não. Entretanto, deveria perguntar à mulher o que precisa dele hoje, aqui, agora.

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É um trabalho de equipe... O pai abandona-se em função da mãe, que abanonda-se em função do filho... Colocando-se ao serviço do outro, a mais sublime forma de expressão do amor. 

Confiscado!