A reflexão dos 30.
Começo pelo passado. Uma das primeiras coisas que me veio em
mente foram os meus 15 anos e um livro que li “Meus vários 15 anos”.
Aos 15, sonhava com uma festa “tradicional”, com vestidos
deslumbrantes, jantar e valsa. Num típico delírio consumista deslumbrante. Mas
ao mesmo tempo, meu lado “do contra” trocou a festa por um cavalo. E isso foi
determinante. Aos 15, ganhei algo que mudou e determinou uma boa parte da minha
vida. Iceberg, um cavalo meio sangue quarto de milha que me desafiou em
inúmeros aspectos, e que hoje me provoca um misto de vergonha e agradecimento.
Vergonha pois foi nesta época que achei que violência, com animais, resolveria
alguma coisa. Vergonha por hoje perceber que o cavalo era um objeto que eu utilizava
para descarregar minhas frustrações. Vergonha por ter demorado a perceber que
mesmo eu batendo ou tentando “ensinar” alguma coisa a ele, isso não aliviava
minhas frustrações. Vergonha por ter tentado ser uma boa amazona por tantos
anos e não ter conseguido. Vergonha por inúmeras outras coisas que vivi com os
cavalos e seu “meio moderno”.
Agradecimento por tudo que aprendi. Pelos dias que chorei
por não ter conseguido. Pelas provas que perdi, pelas competições que
participei, que tiveram um papel importantíssimo na aproximação de meu pai.
Pelos lugares que conheci, pelas pequenas provas que fui tendo ao longo do
caminho de que é possível fazer as coisas com animais sem usar a violência e
que culminaram com a minha opção de me tornar vegetariana e aos poucos ir adquirindo o respeito à vida.
Ah, a violência. Em suas inúmeras formas de expressão. Que
hoje através da maternidade tem mexido tanto comigo. Violência e exploração
animal, violência infantil, o que há de comum? Em ambos os casos, é violência
contra um ser que não consegue expressar seus desejos de uma maneira clara para
nós “adultos civilizados (?!)”. Um ser que nem sempre obedece nossas vontades e nós, na nossa
megalomania do ego, achamos que deveriam ter praticamente força de lei, pois
nós somos os adultos e temos o poder.
Aos 30, formada, com marido e filho, feminista recém
descoberta, empreendedora tímida, contestadora, ou como diria minha mãe: procuradora de cabelo em
ovo.
Na confusão dos 15, sonhava que com 30 tudo estaria resolvido ahahahahhahahahahhahahhaahahahaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh
Na confusão dos 15, sonhava que com 30 tudo estaria resolvido ahahahahhahahahahhahahhaahahahaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh
É engraçado e me deixa desesperada ao mesmo tempo.
Contraditório, como sou em muitos aspectos.
Portadora de uma subjetividade que me engole, num emaranhado
de possibilidades cada vez mais complexas. Até descobrir a complexidade de
Edgar Morin e me sentir um pouco compreendida (por mim mesma, vejam bem).
Aos 30 posso assumir que dentro de mim, meu grande desejo
“material” sempre foi o da maternidade. Por mais que eu tentasse ter um grande
desejo na carreira profissional, como é o esperado nos dias de hoje: ser alguém
bem sucedido, isso não me satisfez. Até que após o mestrado, com 25 anos,
assumi que não sabia o que fazer da vida. Assumi minha dificuldade de me
encontrar e prover o meu próprio sustento. Assumi minha incapacidade de
abandonar o lar e cair no mundo na luta desenfreada da sobrevivência. Com uma
faculdade e uma mestrado nas costas, fui fazer cookies e cupcakes e fazer bico
em empresa de decoração de casamento. No meio tempo conheci meu futuro marido,
que morava em Portugal. Portugal?! Nunca pensei em ir a Portugal. O mais perto
que cheguei foi o clube Português e o tradicional bacalhau. Pensei em
voluntariado, o sangue sagitariano bateu forte e rumei além mar. Para mais uma
vez me descobrir incapaz. Descobrir e sozinha criar coragem para assumir o
fracasso e a necessidade de uma vida menos aventureira ou mais confortável. Meu
outro sonho de cair no mundo fazendo voluntariado foi se embora no Montijo, a
beira do Tejo.
Mais uma vez tive que me reinventar e dessa vez, buscando
começar minha própria família, fui contra meus instintos, numa tentativa de me
enquadrar no padrão da sociedade cuja pressão eu sentia como: tens que
trabalhar e ganhar dinheiro. Fiz o que eu sabia fazer, fui estudar. É o que
faço melhor, não tenho grandes dificuldades, vou ter um salário e essa parte
vai ficar tranquila para eu poder cuidar das outras. Eu estava imensamente
feliz por ter encontrado meu esposo e aceitei profundamente agradecida a
oportunidade de cursar um doutorado.
Veio a maternidade e desmoronou tudo que eu vinha tentando
construir na tentativa de me enquadrar na sociedade. Ainda numa última
tentativa, deixei meu filho numa creche, indo contra todos os meus instintos
que bradavam vorazmente contra isso. Não funcionou. Me armei até os dentes e
bati o pé: para a creche meu filho não volta.
Assumi, porque agora já nãe era
só a mim que influenciava, era alguém que nutro profundo amor, alguém
simbiótico, meu filho. Encarei os julgamentos alheios, a não concordância do
meu esposo, e a perda da “independência financeira”. Eu precisava do meu filho
e ele de mim. Era isso que eu sentia, claro! E a lucidez que de tempos em tempos me visita bateu palmas de
felicidade. “Ela conseguiu ouvir seu coração”, aleluia! Obrigada filho, por me
dar forças no seu sofrimento, para que eu conseguisse tomar uma decisão.
Aos 30, me descubro feminista. Me descubro intolerante. Me
descubro caminhante. Me descubro uma meia-ativista. Descubro que pequenas coisas que vão acontecendo ao longo
dos anos tem um poder (que não lhes foi dado) de destruir coisas grandes. E que
quando as percebemos destruidas, não sabemos dizer o que a destruiu. Não é como
uma chuva forte que destelha uma casa. É como uma chuva mansa, que vai se
infiltrando na terra e faz cair o barranco. E aí você olha e diz: mas estava
chovendo tão fraquinho, como isso foi acontecer?
Fragmentos...
Aos 30, nunca imaginei tamanha revolução ou significado. Pela primeira vez me cantaram parabéns e não fiquei envergonhada. Estava inexplicavelmente a vontade.
Aos 30, nunca imaginei tamanha revolução ou significado. Pela primeira vez me cantaram parabéns e não fiquei envergonhada. Estava inexplicavelmente a vontade.
Esses dias, depois de assistir um vídeo (http://vimeo.com/66058153), ao ouvir a
palavra “blessed”, foi como se uma
porta tivesse se aberto. Me lembrei do texto que escrevi na aula de Public Speaking, onde falei sobre Joseph
Campbell e sobre encontrar sua “bem
aventurança” ou bliss. No auge da minha necessidade de encontrar uma...
Não sei onde foi parar o texto agora, talvez esteja perdido
em alguma conta de e-mail ou em algum caderno jogado entre as mudanças que fiz.
O fato é que tive um insight, ou pelo
menos pareceu um: minha bliss é a
maternidade. Isso é o que sempre quis! Pronto, assumi. Levei 30 anos para
descobrir (?!). Talvez seja uma das minhas bliss,
mas essa eu sinto do fundo do meu coração que é. Também assistindo um outro
vídeo li a frase: “Maternidade: Uma ruptura existencial” o que também me fez
muito sentido! Nada na minha vida até hoje foi tão revolucionário quanto a
maternidade. Minha história com os cavalos foi determinante para muita coisa, e
agora, 15 anos depois, uma nova etapa, uma nova revolução: a maternidade. Será
que estou influenciada pelo livro “Meus vários 15 anos”? Ou será que esse
período realmente tem algum significado nas fases que passamos?
E nesse meio tempo da
maternidade, acreditem, várias ideias já passaram por essa cabeçinha. Doula,
cake designer, empreendedora, um café-livraria-floricultura, jornalista
científica, free lancer de textos científicos, e aos poucos fui identificando
uma vontade de ser jornalista. De escrever as coisas que vem na minha cabeça. A
escrita sempre foi uma via de mão dupla para mim. Ao mesmo tempo que morro de
preguiça, outras vezes, escrever é a única solução para eu me entender e
organizar meus pensamentos um pouco.
Infinitas possibilidades como sempre...
Passei o dia 6 trabalhando, fazendo e assando panetones, chocotones e cookies. Confeitando bolos e cupcakes. No dia seguinte iria participar da Feira do Empreendedorismo Materno. Que significativo!
Passei o dia 6 trabalhando, fazendo e assando panetones, chocotones e cookies. Confeitando bolos e cupcakes. No dia seguinte iria participar da Feira do Empreendedorismo Materno. Que significativo!
Confisco o necessário, pois significar algumas coisas tem sido cada vez mais complexo.
Aos 15 ganhou um cavalo, aos 30, fez um bolo de cavalo. Sem mais divagações. Que venham mais 15 :)